Falar sobre a sexualidade do portador de deficiência física implica necessariamente em abordar o conceito sexualidade humana de forma ampla, em toda sua dimensão, ou seja, abrangendo os aspectos físico-biológicos, socioculturais, econômicos e políticos.
Nesse contexto, a sexualidade masculina ainda se confunde com a prática "machista", com todos os significados que este termo contém e que é tão sobejamente conhecido. A sexualidade feminina assume ainda contornos de submissão, repressão, sob a égide da dominação masculina que, contraditoriamente, explora o erotismo do corpo feminino em todos os níveis, transformando-o em objeto de prazer.
A despeito das mudanças que se processam quanto à função social da mulher hoje, principalmente a partir do seu engajamento no mercado de trabalho e, decorrente, de seu papel mais participativo em termos de eqüidade com o homem no seio da família, permanecem ainda resquícios da sociedade patriarcal e autoritária da sociedade fálica.
Estudos mostram que a sexualidade masculina é mais centrada nos órgãos genitais (no pênis), diferentemente da sexualidade feminina, que é mais difusa sobre seu corpo. O corpo predominantemente genitalizado do homem pode ser explicado em função de que este, independentemente de classe social, foi submetido, historicamente, ao processo de produção, foi canalizado para o trabalho.
Indícios de mudanças aparecem na classe média, na qual este modelo começou a ser rompido a partir do questionamento das relações de gênero, provocando uma maior eqüidade no que se refere ao direito à gratificação sexual e à valorização orgástica da mulher.
Assim, a sexualidade masculina, como instrumento de dominação e poder, é uma postura sexual alienante. Essa alienação é parte constitutiva das sociedades que valorizam o trabalho em detrimento do prazer, negando o próprio corpo. São formas mascaradas de repressão, apesar da liberação sexual iniciada há três décadas com o advento da pílula anticoncepcional e a ascensão social e política da mulher.
Esses valores atingem de modo severo os portadores de deficiência física (em conseqüência de danos neurológicos). Estes, a despeito das disfunções sexuais presentes em diferentes níveis, quanto à ereção, ejaculação, orgasmo e reprodução, mantêm a sua sexualidade latente, quando entendida no seu conceito ampliado.
Há que se compreender, todavia, que, para o homem portador de deficiência física, tais limitações acarretam o sentimento de que lhe foi tirado o essencial de sua identidade masculina, construída culturalmente sob o significado simbólico do "poder do falo". Conseqüentemente, tiraram desse homem o "seu poder" nas relações sociais e interpessoais. Na mulher, o impacto da deficiência atinge a sexualidade na sua imediaticidade, ou seja, na sua aparência. Seu corpo, objeto de erotização, apresenta deformidades que o distanciam do modelo de "belo" e "perfeito" forjado pela cultura "machista" e pelo marketing das sociedades capitalistas.
Este pano de fundo está implícito na manifestação da sexualidade humana e, como tal, necessita ser aprendido e compreendido pelos profissionais da Saúde, em especial por aqueles que atuam no processo de reabilitação dos portadores de deficiência física. É necessário que se incorporem ações terapêuticas voltadas para a reabilitação sexual dessas pessoas para ajudá-las a superar suas dificuldades. Assim buscamos caminhos para que possam exercitar sua sexualidade o mais plenamente possível, com a obtenção do prazer físico e psíquico, fatores contribuintes para sua reintegração social saudável.
Fonte: Arlete Camargo de Melo Salimene.
Mestre em Serviço Social da PUC/SP e Diretora do Serviço Social da Divisão de Medicina de
Reabilitação do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Mestre em Serviço Social da PUC/SP e Diretora do Serviço Social da Divisão de Medicina de
Reabilitação do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
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