Automóveis estacionados na calçada e passeios esburacados são alguns dos vários obstáculos enfrentados pela população
Atingido por bala perdida há 22 anos, o cadeirante Wilson Cruz, hoje com 39 anos, é técnico administrativo e diz que sua rotina é cruel. A rua da Mouraria é pavimentada de paralelepípedos e as calçadas se alternam entre pedras portuguesas, buracos e azulejos, colocados por lojistas para decorar a entrada dos estabelecimentos.
O acesso à Lapa ao lado do Colégio Central é o novo desafio para Wilson. “Aqui não dá para descer. No outro lado não tem rampa e a escada rolante vive quebrada”, lamenta. Vendo sua cadeira de rodas trepidar e temendo que o passeio irregular danifique o equipamento, Wilson segue pela pista da Avenida Joana Angélica até chegar a Rua 24 de Fevereiro, ao lado da Universidade Católica.
Já na Estação da Lapa, ele desce uma longa e recém construída rampa de acesso, escura, repleta de fezes, urina e lixo. “Essa é a rotina dos cadeirantes aqui no Centro. Imagine como não é na periferia?, indaga ele, reforçando que os 20 minutos gastos no percurso seriam reduzidos a cinco, se o Centro da cidade fosse acessibilizado.
Assim como Wilson, outras 512 mil pessoas têm alguma deficiência ou mobilidade reduzida em Salvador, de acordo com o último Censo com esse recorte, feito em 2000 pelo IBGE. O Censo de 2010 será divulgado em dezembro, mas a presidente da Associação Baiana de Deficientes Físicos (Abadef), Luiza Câmera, acredita que passados quase onze anos “os números cheguem a 600 mil. Com os acidentes de trânsito e a violência urbana, esse número se multiplica a cada dia porque quando não há óbito deixa sequelas irreversíveis”, diz.
Ação Civil – Passados quase sete anos da regulamentação da Lei de Acessibilidade (Decreto Federal 5.296/2004) – que prevê que as adaptações em prédios públicos e privados fossem implantadas até julho de 2007 em todo o País, com o objetivo de atender às pessoas com deficiência motora ou sensorial – poucas ações foram adotadas por parte das autoridades visando o cumprimento da legislação.
Cabe a prefeitura, por exemplo, a construção de pistas táteis e a instalação de semáforos sonorizados em toda a cidade. Como isso não vem sendo feito, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) moveu uma ação civil, em 2008, contra o município, mas a prefeitura recorreu da decisão no Supremo no ano passado, explica a autora da ação, a promotora Silvana Almeida.
Município de Salvador tem 60 dias para iniciar as obras de acessibilidade
Município de Salvador tem 60 dias para iniciar as obras de acessibilidade
Está mantida a decisão que determina que o município de Salvador (BA) inicie imediatamente a adaptação de todos os edifícios públicos da cidade para facilitar o acesso aos portadores de deficiência – devendo apresentar os projetos arquitetônicos e cronogramas de obras em até 60 dias, sob pena de multa diária de R$ 5 mil. Essa decisão é fruto de ação civil pública movida pelo Ministério Público da Bahia (MPBA). O município recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) com pedido de suspensão de liminar, o qual foi negado.
A antecipação dos efeitos da tutela, para determinação do início imediato das obras, solicitada pelo MP, foi atendida pelo juízo de primeiro grau e mantida pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA). Consta do acórdão estadual que o acesso aos portadores de deficiência é garantido pela Constituição e regulamentado por legislação de 2004, portanto o dever da prefeitura do município data de antes da imposição judicial.
O município de Salvador, em sua defesa, procurou caracterizar a decisão como uma intervenção judicial no andamento dos projetos já elaborados para a promoção da acessibilidade. A defesa acusa o Judiciário de afetar a normal execução dos serviços públicos e o exercício das funções da administração, pois o tribunal estadual estaria escolhendo a destinação dos recursos públicos. Queixou-se, além disso, da escassez do prazo, dizendo que “talvez seja difícil até mesmo apresentar o projeto arquitetônico de reforma de uma só escola, quiçá de uma cidade inteira”.
O presidente do STJ, ministro Ari Pargendler, ao rejeitar o pedido da prefeitura, destacou as palavras usadas pela desembargadora relatora da decisão estadual: “Não cabe ao Judiciário deliberar sobre conveniência e oportunidade administrativa, porém, quando a inércia do ente obrigado transgride a própria dignidade humana, a intervenção se impõe.” O ministro asseverou que a decisão não causa lesão à ordem administrativa, pois apenas determina que o município cumpra sua obrigação (Decreto 5.296/04), “providência que já tarda há sete anos”.
Quanto ao prazo dado pelo Judiciário, de 60 dias, o presidente destacou que o processo tramitou com efeitos suspensos por mais de seis meses, de modo que o prazo já foi dilatado. O ministro Ari Pargendler comentou que tanto o prazo quanto os outros aspectos da decisão, incluindo a aplicação de multa, poderão ser revistos pelas instâncias ordinárias, na análise dos recursos próprios.
Fonte: Jornal A Tarde
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